2024-12-29 HaiPress
A Margem Equatorial — Foto: Reprodução / Google maps
GERADO EM: 27/12/2024 - 19:19
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A transição energética desponta como um dos maiores desafios do século,exigindo uma combinação cuidadosa entre inovação e pragmatismo,sustentada por ciência e pelas realidades técnicas e econômicas. Recentemente,Cristiano Vilardo — no artigo “Petróleo à margem,não na Margem”,publicado no GLOBO — defendeu a renúncia à exploração de petróleo na Margem Equatorial,em favor de uma transição imediata para energias renováveis. Embora bem-intencionada,essa visão simplifica questões estratégicas como segurança energética,desenvolvimento econômico e o papel que os recursos fósseis ainda desempenham.
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Vilardo critica os defensores da exploração na Margem Equatorial por construírem “narrativas”. Contudo,ao basear-se em dados frágeis e frases impactantes,ele próprio incorre em argumentos fictícios. Transições energéticas não acontecem de forma abrupta. A transição do carvão para o petróleo levou mais de um século,e o carvão ainda responde por 27% da matriz energética global. Atualmente,os combustíveis fósseis representam 80% dessa matriz. Ignorar essa realidade é um ato de idealismo perigoso.
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Negar a exploração da Margem Equatorial comprometeria receitas governamentais bilionárias,essenciais para saúde,educação e infraestrutura,incluindo financiar tecnologias de captura de carbono e a expansão de fontes renováveis. Além disso,o Brasil seria forçado a importar petróleo,com custo estimado em US$ 21 bilhões anuais. Isso aumentaria suas emissões de gases de efeito estufa,ao adquirir petróleo de maior intensidade de carbono,e exporia o país a riscos geopolíticos.
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O autor apoia-se nos compromissos globais firmados durante conferências climáticas,mas ignora que os países signatários continuam explorando seus recursos naturais. Nações como Estados Unidos e China são exemplos de pragmatismo: exploram seus recursos fósseis enquanto lideram investimentos em renováveis,demonstrando que esses objetivos não são excludentes.
Tal como o pré-sal no passado,a exploração da Margem Equatorial transcende o âmbito técnico,envolvendo decisões políticas que definirão o futuro energético do Brasil. A ministra Marina Silva,uma política,afirma que a decisão será “puramente técnica”,mas é possível dissociar técnica de política em decisões dessa magnitude? Questões estratégicas como energia envolvem valores,prioridades e interesses nacionais.
A Noruega,na década de 1970,enfrentou dilema semelhante ao decidir explorar suas reservas de petróleo no Mar do Norte. Combinando análises técnicas detalhadas e visão política sustentável,o país criou um modelo de governança exemplar,incluindo forte regulação ambiental e o fundo soberano que hoje é referência mundial.
Em contraste,a decisão da Alemanha de desativar suas usinas nucleares após o acidente de Fukushima,em 2011,exemplifica o risco de decisões políticas desconectadas da técnica. Ignorando alertas de maior dependência do gás russo,a medida resultou em vulnerabilidade geopolítica e no aumento das emissões de carbono.
A História ensina que decisões bem-sucedidas combinam base técnica sólida com visão política responsável. Essa integração é o caminho para construir um futuro energético que respeite o meio ambiente sem comprometer o bem-estar e a prosperidade da sociedade. A Margem Equatorial é um ativo estratégico e deve ser explorada de forma sustentável e regulada,servindo de ponte para financiar a transição e garantir a segurança energética do país. A matriz energética do Brasil é uma das mais limpas do mundo,o que lhe dá autoridade para superar narrativas idealistas e adotar uma estratégia que integre ciência,pragmatismo e visão de longo prazo.
*Marcos da Costa Cintra,executivo do setor de petróleo,gás e energia,é doutor em energia pelo IEE-USP e presidente do Instituto Pensar Energia (www.pensarenergia.org.br)