2025-02-11
HaiPress
Unidade do centro de gastronomia Eataly,em São Paulo — Foto: Divulgação
GERADO EM: 10/02/2025 - 22:22
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A Justiça de São Paulo suspendeu,em janeiro,uma ordem de despejo contra a Eataly Brasil após a empresa entrar com pedido de recuperação judicial e argumentar que o imóvel é essencial para a continuidade de suas operações.
A decisão foi tomada após a Caoa Patrimonial,proprietária do espaço na Avenida Juscelino Kubitschek,onde funciona o "mercadão" gastronômico de luxo,ter solicitado o despejo no ano passado alegando inadimplência dos alugueis.
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O caso é mais um capítulo de uma disputa que se arrasta há anos em torno do futuro da marca.
O passo anterior aconteceu no início de janeiro,quando a franqueada brasileira perdeu o direito de uso da marca Eataly no país por suposto descumprimento contratual. Procurada,a empresa informou que o direito de uso da marca estaria sob processo de arbitragem,no qual as partes buscam um acordo sobre o caso.
A Eataly Brasil disse que o pedido de recuperação judicial,feito no final de novembro,não impacta as operações da empresa,nem interfere no cumprimento de obrigações contratuais,fluxos regulares de pagamento ou nas condições previamente acordadas com parceiros e fornecedores.
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A Eataly chegou ao Brasil em 2015 por meio de dois empresários,sócios do supermercados St. Marche,mas posteriormente foi vendida para a SouthRock,companhia que administrava o Subway e a Starbucks no país. Em 2023,os direitos da franquia foram novamente repassados,dessa vez ao fundo Wings.
Em março de 2024,a coluna Capital,do GLOBO,revelou que a SouthRock havia acionado judicialmente o fundo Wings por falta de pagamento na aquisição da Eataly Brasil. O acordo,fechado em novembro por R$ 3,5 milhões mais as dívidas,previa pagamento em duas parcelas,sendo a última em 22 de novembro. A mesma coluna também havia noticiado que a Eataly acumulava débitos com fornecedores.
A Eataly foi criada pelo empresário italiano Oscar Farinetti,que idealizou um espaço que combinasse mercado,experiência gastronômica e aprendizado sobre a cultura italiana. Para isso,percorreu diversas regiões da Itália em busca de produtos típicos e inaugurou a primeira unidade na cidade de Turim,em 2007.
Segundo Ulysses Reis,professor de MBAs da FGV,o conceito da Eataly segue a filosofia do slow food,que valoriza ingredientes regionais.
— A ideia do Farinetti era apresentar produtos italianos organizados por áreas,oferecendo informações sobre cada item. Os vendedores explicam tudo sobre os produtos. O objetivo era difundir a cultura italiana,para que os clientes conhecessem e experimentassem produtos regionais,além de aproveitar os restaurantes e lanchonetes.
No entanto,esse modelo de negócio é extremamente caro,afirma Reis,devido à necessidade de importar produtos como queijos e vinhos,produzidos muitas vezes em pequenas cidades italianas. Além disso,há despesas elevadas com a franquia e com a identidade visual sofisticada,uma das marcas registradas da Eataly.
Tanto que as dezenas de centros gastronômicos da Eataly estão localizados em cidades turísticas,onde predominam moradores de renda elevada. Ou seja,na avaliação do especialista,o modelo de negócio se mostrou caro para o consumidor brasileiro.
— O custo é alto tanto para a empresa quanto para o cliente. É um local para experiências gastronômicas,não é um local para onde você vai toda semana. São Paulo foi escolhida por ser uma megalópole,com pessoas de grande poder aquisitivo,incluindo descendentes de italianos — diz Reis.
Cristina Souza,CEO do Gouvêa Foodservice,explica que a escolha da localização foi influenciada pela renda elevada das pessoas que circulam pelo bairro. Ela avalia que,se o Eataly estivesse em uma área como a Avenida Paulista ou em Pinheiros,onde há um fluxo constante de pessoas independentemente da renda,o desempenho poderia ter sido melhor. Isso se deve ao fato de que a área de restaurantes do Eataly representa cerca de 60% do faturamento,diz.
— Há desde uma padaria,onde o cliente pode comer um sanduíche,até um restaurante de carnes caríssimo. Nós traduzimos o Eataly como algo muito sofisticado,e na verdade não é.
Ela diz que,no início,havia um grupo financeiro especializado em varejo alimentar por trás da operação,mas talvez não tenha havido confluência de competências complementares: era necessário estruturar bem tanto a parte de varejo alimentar quanto a de operação de restaurante. Além disso,a pandemia afetou grandes negócios,e o Eataly,sem dúvida,foi um deles. Com a chegada de outros players no mercado,o problema cresceu:
— Para que eu vou até o Itaim comprar molhos e macarrões se,perto da minha casa,nos Jardins,posso ir ao Empório Fasano ou à Casa Santa Luzia? Independentemente da sua origem no Brasil,você gosta de comida italiana de alguma forma. Eles tinham tudo para conquistar muitos lovers por aqui,mas acho que faltou agilidade para nacionalizar parte do mix e atender melhor o varejo. Também acho que faltou rapidez no serviço dos restaurantes para reverter o quadro.
Marcelo Guedes,coordenador dos cursos de Administração e Marketing,diz que houve um desconhecimento da empresa sobre a realidade do mercado nacional.
— Até que ponto um país como o Brasil consegue sustentar essa estrutura? O maior erro foi o desconhecimento da realidade local. Quem frequenta o Eataly no exterior vem com uma expectativa diferente. O que não consome ou conhece em Nova York muitas vezes tem poder aquisitivo menor — diz,acrescentando que o fato da franqueada ter passado de mão em mão desde 2015 foi um agravante.
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