2024-11-11 HaiPress
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva,em evento no Palácio do Planalto — Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo
GERADO EM: 10/11/2024 - 19:53
O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
CLIQUE E LEIA AQUI O RESUMO
Pressionado após um resultado eleitoral em que partidos da direita demonstraram mais força do que o PT,o presidente Luiz Inácio Lula da Silva aumentou as cobranças sobre os ministros para que apresentem políticas públicas voltadas para a classe média. As apostas em desenvolvimento incluem estimular o crédito para micro e pequenos empreendedores,fomentar a exportação de empresários desses grupos e tornar possível,dentro das discussões sobre corte de gastos,ampliar o programa Pé-de-Meia,que oferece bolsas a estudantes.
Ex-presidente: Bolsonaro elogia ex-ministro de Lula e Dilma e diz que 'sonha' em tê-lo em eventual primeiro escalãoAliados de Lula,Boulos e João Campos trocam farpas por eleições: 'Não está autorizado a me dar aulas'
A leitura no Planalto é que os programas estão muito concentrados nos segmentos de renda mais baixa e que o governo tem perdido a batalha em outros estratos sociais. Há a reclamação ainda de que ações direcionadas à classe média,como a isenção de Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil mensais,estão travadas dentro da própria gestão ou no Congresso.
Pesquisa Quaest divulgada em setembro mostra que a reprovação de Lula entre quem ganha de dois a cinco salários mínimos é de 46%,índice que era de 38% em agosto de 2023 — a aprovação no segmento é de 51% agora. Já na faixa que recebe até dois salários,32% desaprovam o governo,enquanto 62% estão satisfeitos.
O Ministério de Desenvolvimento Social estima que 43% dos brasileiros integrem a classe média. À frente da pasta,o ministro Wellington Dias afirma que Lula pede com insistência a expansão desse patamar,para que alcance mais da metade da população já no fim deste mandato.
— Muitas vezes o governo centra a prioridade nos mais pobres. E é também por isso que está havendo essas mudanças também no foco das políticas. A gente ainda está na época da CLT e contrato de emprego,mas as pessoas querem trabalhar como autônomas. Temos que revisar nosso pensamento e prioridades — reconheceu Dias ao GLOBO.
Outros interlocutores do presidente fazem a ressalva,no entanto,de que apenas ações para a classe média não bastam. De acordo com esta interpretação,o governo também oferece sinais trocados que incomodam outros estratos,como a indefinição sobre o cenário fiscal que tem estressado o mercado.
Para promover essa expansão e fidelizar aqueles que já estão nesta faixa,a aposta é na economia. Um dos eixos é aumentar o crédito subsidiado a juros baixos,tarefa que está a cargo do ministro Márcio França (Empreendedorismo e Microempresa). Uma das linhas do programa Acredita oferece financiamento de R$ 150 mil e está tentando alcançar o público até mesmo por WhatsApp. Segundo a pasta,já foram disparadas dez mil mensagens para o público-alvo que tem direito,mas ainda não foi ao banco atrás dos recursos.
— Muitas vezes essas pessoas se irritam: “Para os outros,mandam Bolsa Família,e para mim manda guia de imposto”. E eles são tão pobres quanto os outros. Quando surgiu o Pablo Marçal,caiu a ficha da esquerda de que esse é outro público,com o qual a gente não consegue se comunicar direito. O discurso para o público do CadÚnico é o que nos enche a boca,mas tem esse segundo público que fica amassado. Não está tão distante do CadÚnico e não tem uma renda com folga — avalia França.
Em reuniões com seu círculo mais próximo no Palácio do Planalto,Lula tem reclamado que a maior parte dos programas do governo é direcionada a beneficiários do CadÚnico,que reúne um conjunto de informações sobre as famílias brasileiras em situação de pobreza e extrema pobreza e inclui 43 milhões de famílias que podem ter acesso a 30 programas sociais. Podem se inscrever as que têm renda mensal de até meio salário mínimo (R$ 1.412) por pessoa,o equivalente a R$ 706.
A equipe do Ministério da Educação tem em mãos cenários de orçamento para ampliação do Pé-de-Meia para todos os estudantes do ensino médio de escolas públicas — o que estenderia o benefício para mais 2 milhões de alunos. O desafio é fazer com que a ampliação caiba nos cofres num momento em que cortes de gastos estão no foco da equipe econômica.
O programa,é bem avaliado no Planalto. Foi uma das raras iniciativas em que o governo investiu pesado em divulgação,com direito a “turnê de lançamento” com o ministro da Educação,Camilo Santana,por diversos estados do país. Além de ser uma das vitrines preferidas de Lula,é visto internamente como uma das poucas inovações do terceiro mandato do petista e que projetou Santana no segundo ano de governo.
A hipótese de expandir o Pé-de-Meia para todos os estudantes de escolas públicas em um outro momento atenderia a um desejo de Lula,indo ao encontro do objetivo de aproximação com a classe média.
Apostar no combo que vai de apoio aos empreendedores a investimentos na educação é a janela que o governo viu nesse momento para tentar se aproximar de um público que é heterogêneo e que mudou prioridades em relação aos primeiros dois mandatos de Lula.
— Queremos criar um país com padrão de consumo,educação e transporte de classe média — afirmou Lula em fevereiro.
Outra iniciativa é um programa que vem sendo elaborado para ampliar a exportação desses pequenos empresários. A iniciativa está a cargo da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex). Atualmente,micro e pequenas empresas representam cerca de 41% do total das empresas exportadoras brasileiras,segundo o Sebrae.
Comandada por Jorge Viana,a Apex assinou em setembro 23 convênios com entidades empresariais e o Sebrae para dar apoio às exportações do país. Um dos pontos é incentivar microempresas e cooperativas das regiões Norte e Nordeste a iniciar ou aperfeiçoar estratégias voltadas para a exportação.
As novas tentativas de atrair a classe média ocorrem enquanto iniciativas já anunciadas travaram. Promessa da campanha eleitoral,há dois anos,o avanço da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil,por exemplo,é considerada peça-chave para atingir esse público. Lula prometeu o benefício até 2026. Atualmente,a isenção vale para quem ganha até dois salários mínimos. Integrantes da equipe econômica afirmam que o pacote de corte gastos que está em discussão é fundamental para que o presidente cumpra o objetivo ainda neste mandato e dentro dos limites do arcabouço fiscal.
O governo também está longe de uma solução para outra promessa: regularizar a profissão de motoristas de aplicativo. Após levar ao Congresso um projeto que gerou protestos pelo país e desgaste dentro do próprio governo,o Ministério do Trabalho não tem sequer previsão de votação do texto ao mesmo tempo que vê esse segmento se aproximando cada vez mais da direita.
O governo avançou,porém,em ações como a redução de juros no rotativo do cartão de crédito. O Conselho Monetário Nacional (CMN) decidiu fixar um teto de 100% para as taxas de juros do rotativo do cartão de crédito sobre as dívidas que não forem pagas pelos usuários. Com isso,o débito poderá no,máximo,dobrar.
— O PT tem um debate a fazer com os trabalhadores,sobretudo os que ganham de 2 a 10 salários mínimos,que por algum motivo não se sentem representados — disse o ministro de Relações Institucionais,Alexandre Padilha,após uma conversa com Lula no dia seguinte ao segundo turno.